Na noite passada minha avó veio me visitar. Ela costumava fazer crochê na frente da televisão. Morreu há muito tempo, quando eu ainda era criança. Mas sonhos enganam a gente e neles as coisas mais impossíveis parecem completamente normais.
Eu, assim como sou hoje, estava sentada no tapete da sala vendo-a preparar uma longa colcha de lã. Aquela de quadradinhos, sabe? Eles, já prontos, centenas, coloridos, estavam sendo unidos em cor marrom.
Em um certo momento ela soltou o já conhecido “Ó” português que costumava fazer quando percebia que algo estava errado e sem duvidar puxou o fio e começou a desfazer a união dos MUITOS quadradinhos já atados. Eu, desesperada com aquele trabalho em vão, disse:
- Por que você está fazendo isso Dona Conceição?
- Ó, que eu errei um ponto aqui no comecinho.
- Mas vó, você vai ter que voltar até aí para consertar? Não é mais fácil deixar assim?
- É. Mas às vezes a gente precisa voltar atrás para resolver os pontos errados e fazer a união dos quadradinhos de maneira correta.
Achei a resposta estranha, não sei porque:
- Posso puxar para você, vó?
- Pode! Mas não vai me estragar a lã, só tem essa. Vou fazer o jantar.
Ela me deixou sozinha com a colcha nas mãos, eu comecei a puxar. Puxei, puxei, mas não tinha fim. Comecei a ficar com medo, a lã desenrolada estava esparramada ao meu redor em uma quantidade gigantesca, começando a me sufocar:
- Vó socorro! Vem me ajudar.
Ela voltou e parada no vão da porta entre a sala e a cozinha respondeu:
- Agora você vai ter que terminar. Tem muito fio para você puxar até entender onde a gente errou.
Acordei assustada, olhei para a beira da cama e vi a velha colcha marrom cobrindo meus pés.
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