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Tatiana Navega

Entre estrelas, vento frio e caminhões

Olho fixamente naqueles olhos lindos, estou completamente apaixonada, torço para que ele esteja também. Vamos para a casa onde ele mora, é pequena, simples, um pouco bagunçada, mas aconchegante. Ali, preparamos o almoço, escutamos música, passamos horas e horas juntos. Pelo jeito nenhum dos dois quer que o encontro chegue ao fim.


Porém, a tarde cai e pelo celular, chega uma mensagem que o relembra de um compromisso esquecido. A tristeza dos dois é nítida, mas então, ele carinhosamente me convida para acompanhá-lo. Eu vou.


De mãos dadas caminhamos na direção de uma rodoviária, é na cidade vizinha, ele explica, vai ser legal. Encantados, subimos no ônibus, nossa carruagem dourada, a viagem é demorada, vai parando em vários pontos de beira de estrada, mas estou feliz. Não solto de sua mão.


A gente chega, já é de noite, descemos em um posto cheio de caminhões, sem estrutura, banheiro improvisado, sinto frio, não trouxe blusa, apenas carteira e celular. Um grupo virá nos buscar. E quando chega, rapidamente percebo que no carro, só tem um lugar.


Sem jeito ele conversa com os amigos e volta para me dizer:


- Não tem espaço para você.


Disfarço a mágoa, ele não avisou que eu viria e um deles, impaciente, olha irritado na minha direção. Não querendo ser empecilho digo que vou para casa, que está tudo bem, ele me dá um beijo, sorri, diz que admira meu espírito de aventura, agradece pela companhia, entra no carro e vai embora.


Eu fico, entre estrelas, vento frio e caminhões.


Cansada, caminho pelo posto até encontrar uma pequena cabine que vende passagens dos ônibus que passam por ali. Para minha cidade, só amanhã. Mas há outra alternativa, ir para cidade ao lado, fazer conexão, de madrugada você chega lá.


Aceito. É a única opção.


Na boca doce de beijos, um gosto amargo começa a surgir. Meu tempo, meu dinheiro, minha paciência, esparramam pelo chão. Como cheguei até aqui? Olho para o céu, um ponto brilhante chama a minha atenção, sinto vontade de gritar.


O barulho do meu coração me faz acordar!


Era um sonho. Não conheço o personagem, mas a raiva por ter ultrapassado meus limites, é bem familiar.

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