Já faz um tempo, mas eu me lembro muito bem. Ele chegou e me conquistou. Eu, olhos ingênuos de não saber, não enxerguei os sinais de devastação. Ele, dizendo que seria para o meu crescimento, para a minha evolução, me transformou. Derrubou o que em mim era virgem, diverso, singular e original. Eu me desmatei, me modifiquei, me destruí, arranquei de meu corpo, obediente, tudo aquilo que ele dizia não agradar.
Deixei que meu rio chamado desejo fosse represado, remodelado, suavizado, passei a seguir determinado fluxo sem perceber que eu desaguava, sem violência, educada, sempre nas mesmas mãos. Meu desejo domesticado passou a obedecê-lo, terminei - sem referências que não as dele para comparar - querendo SER exatamente o que ele esperava de MIM.
Minha floresta de sonhos foi completamente dizimada:
- Ela é perigosa, ele dizia, escura, misteriosa demais, passível de fazer você se perder.
O que eu não sabia é que ele temia que eu, ao perceber a violência de suas ações tivesse para onde fugir, tivesse como me sustentar. Sobraram apenas uma ou duas árvores-sonho, justamente as que davam os frutos que a ele pareciam agradar.
Porém, o tempo passou, eu cresci e grande, olhando de um ângulo que antes minha pequenez não me deixava alcançar, enxerguei os padrões. Se eu havia me transformado tanto, como pude ficar igual, em gostos, desejos e formas, a todos ao meu redor? Em silêncio, passei a observar. Foi então que eu percebi, em um momento de lucidez, a lógica do colonizador.
Ele chega, te destrói, te deixa exatamente como ele quer. De fácil acesso, com estradas abertas, expostas, sem nenhuma proteção. E você, frágil, faminta, carente de defesas, amor-próprio, auto sustentação, aceita exatamente o que ele tem para dar. Mas o que ele oferece, não vem de graça, com um questionável discurso de justiça ele diz que, para merecê-lo é preciso que você dê algo em troca. Em geral, coisas simples, seu tempo, seu amor, sua fidelidade e a sua dedicação.
Agora que eu o conheço, vejo suas marcas em todo lugar. Desejo que você o enxergue também e assim como eu, resgate a diversidade natural que foi arrancada de nós.
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