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O sono de Perséfone

Ali, na beira do colapso daquilo que sou, quase do lado de fora de mim, existe uma pequena sacada na qual às vezes me sento, em cuidadoso silêncio, para me deixar descansar.


Nessas ocasiões, fecho devagarinho a porta atrás de mim e para me distrair - na verdade para fazer passar o tempo em que me afasto de minha própria companhia - levo comigo os pedaços recém rasgados de vida, para tentar remendar.


Nesse espaço vazio, longe do barulho dos meus achismos e opiniões, apartada das minhas loucuras e paixões, me parece mais fácil regenerar os buracos que quando desperta e cansada, me auto infrinjo, para de mim, furiosamente escapar.


Concentrada, me ponho a costurar, acompanhando o ruído do meu sono profundo, que facilmente atravessa o que me separa, como se eu pudesse assim, através do movimento das minhas mãos, controlá-lo e fazê-lo durar.


Mas como descansar é o mesmo que renascer, cedo ou tarde escuto-me mexendo na cama e me ouço chamar. Quando me viro, vejo meu o rosto renovado e de bom humor. Então, da beira do colapso, da pequena sacada quase do lado de fora de mim eu saio, para com um sorriso me escutar dizer:


- O que você ficou fazendo enquanto eu dormia?


E completamente subordinada a beleza que novamente emana do meu existir, escondo os pequenos remendos e como se nada tivesse acontecido, inocentemente respondo:


- Nada. Estava apenas a te esperar.

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